Incidente no Sítio do Gama (1978)

18 de Novembro, 2019admin0 comments

O primeiro Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle de Tráfego Aéreo – CINDACTA I entrou em operação 30/04/74, sendo responsável pelo controle do espaço aéreo no quadrilátero envolvendo São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília. Uma nova Era para a Aeronáutica, um orgulho da instituição até hoje. O sistema contava com uma rede de mais de cinquenta unidades entre sítios de telecomunicações, chamados de Destacamentos de Proteção ao Voo – Telecomunicações, DPV-T, e outros quatro sítios que incluíam além de telecomunicações a função de detecção radar, os DPV-DT (figura 1). Eles eram a infraestrutura de campo, levando ao CINDACTA I as informações do espaço aéreo. Entre todos os sítios, nenhum era mais importante que o Sitio do Gama, o DPV-DT61, localizado no Distrito Federal no município do Gama, operacional a partir de 02/05/75. Ele centralizava a rede de sítios:

“Cada DPV-DT recebia as mensagens e as enviavam, via tropo difusão, de sítio em sítio, até o sítio do Gama que, por sua vez, transmitia, por micro-ondas de visada direta, para o CINDACTA I.” (nota 1).

Graças a essa rede de sítios de telecomunicações e detecção foi inaugurado às 21h00min do dia 22/10/76 o Centro de Controle de Área de Brasília, ACC-BS, responsável pelo controle do espaço aéreo do quadrilátero. Um momento mágico para a Aeronáutica e o país. Pois bem, poucos meses após a Operação Prato no Pará, o Sítio do Gama, de enorme importância estratégica para o país, foi invadido por um corpo luminoso. Entre 20h30m e 23h50m do dia 20/06/78, três tenentes, entre eles o Comandante do DPV-DT, tenente Vieira, o Chefe da Segurança, tenente Paulo, dois sargentos, incluindo o Chefe da Guarda, sargento Lopes, um cabo, oito soldados, quatro vigilantes e um técnico, viveram uma experiência incomum. Para nossa sorte, o Comandante do DPV-DT61, tenente João Bernardo Vieira, fez algo de grande importância para o registro dos eventos: cada um dos envolvidos, civis e militares, foi orientado a escrever relatório de próprio punho, relatando os acontecimentos vividos, logo depois dos fatos, entre 20 e 21 de junho de 1978. Os arquivos do incidente no Sítio do Gama estão disponíveis no Arquivo Nacional, sob os códigos BR AN,BSBARX.0.0.183, BR AN,BSB ARX.0.0.185 e BR AN,BSB ARX.0.0.190.

ESTAÇÃO DE HF

Antes das 20h30min, o vigilante da Estação de HF (High Frequency), onde ficava uma alta torre de transmissão de ondas curtas, ouviu barulho no mato em torno das instalações. Quando o sargento Odilon retornou do jantar às 20h30min, foi informado da ocorrência. Passados uns 20 minutos, identificou o ruído da trava do portão da cerca em torno da Estação sendo aberta. Esperou para ver se era alguém do destacamento entrando. Como ninguém apareceu, apagou as luzes da Estação. Ouviu ruídos na cerca. Para escutar melhor desligou a chave geral da Estação, e identificou um assovio. Telefonou para o Comandante da Guarda, o sargento Lopes.

O OBJETO

O Comandante da Guarda, sargento Lopes chegou ao prédio do THF acompanhado do cabo Pereira e 3 soldados. Lopes notou um objeto parado próximo e abaixo do topo da torre da antena, com grande variedade de luzes que piscavam como as de navegação de uma aeronave, prejudicando a nitidez da observação. O objeto pareceu decolar sem causar barulho e sumiu da visão. Nas palavras de Lopes:

“Quando o CMT da Guarda foi solicitado e chegou na estação de THF, notou que o objeto parecia decolar sem que fosse possível vê-lo com mais nitidez devido à variedade de luzes que apresentava e piscava como que luzes de navegação de aeronave. Outra é que não se notava qualquer barulho.”

Por sua vez, o soldado Pedro, também presente, observou luzes vermelhas e amarelas e na hora associou a um helicóptero. O comandante da guarda deixou o soldado Pedro como reforço na Estação de HF, junto ao sargento Odilon e o vigilante Souza, retornando ao Comando.

TIROS DE HK-33

Os três que permaneceram de guarda na Estação de HF, ouviram barulhos sobre o telhado, identificados como de pedras sendo jogadas. Sargento Odilon se comunicou com o tenente Paulo, Chefe da Seção de Segurança, que o autorizou a realizar disparos do fuzil HK-33 (nota 2). Não houve qualquer reação aos tiros. Não foi especificado em qual direção foram dados. Odilon e o vigilante Souza subiram no telhado da Estação e vislumbraram sombras no meio do mato em torno do local. Os registros indicam que nesse momento, estava também no local o cabo Pereira, talvez vindo pelos disparos de HK-33 de Odilon. Aqui teremos uma divergência entre relatórios. Em Odilon, o cabo Pereira dispara na direção das sombras quando indicadas pelo sargento. Em Pereira, ele dispara logo que uma pedra quase o atinge. Nas palavras de Odilon:

“Me comuniquei com o Tenente Paulo que me autorizou a fazer uso do fuzil – metralhadora HK 33, não houve respostas aos meus disparos. Subi o telhado da estação junto com o vigia Souza e olhando por cima deu para distinguir sombras em movimento no mato ao redor da estação. O cabo Pereira abriu fogo na direção indicada por mim, recebeu como resposta uma pedrada, que bateu na parede do THF e quase caiu em sua cabeça. Fato comunicado, vieram os oficiais do destacamento, e viram o objeto pairando no ar; logo após sumindo também.” (figura 2)

Fato é que foram disparados vários tiros na Estação de HF, mas não só lá. Na Estação de Micro-ondas, o soldado Arlindo e o vigilante Reinaldo também fizeram disparos quando o objeto “com muitas luzes” passou “bem baixinho”.

DANÇA DAS LUZES

O corpo luminoso se esbaldou pela instalação. Sobrevoou o prédio do Comando do DPV-DT61, a portaria principal, sobre a Estação de Micro-ondas, a antena do radar LP-23 e áreas adjacentes. Uma festa. Palavras do soldado Julimar:

“(…) eu deçi e vi todo mundo na frente do comando. Quando chegei o objeto voador não identificado estava acima do comando até meio parado e deu para eu ver ele tinha varios tipos de luz. Amarela, vermelha, e branca, foi as que eu vi.”

Os oficiais foram acionados.

O tenente Paulo, Chefe da Seção de Segurança, foi avisado por telefone dos fatos, ordenando o reforço dos postos de serviço e entrou em contato com a Defesa Aérea para possível detecção por radar do objeto. Dirigiu-se para o destacamento.
O Comandante do DPV-DT61, tenente Vieira, ligou para o tenente Pedro, ordenando que se preparasse armado para irem juntos ao destacamento.
Chegando, os oficiais viram o objeto. Palavras do tenente Moraes:

“(…) notei que uma luz mais intensa, semelhante a uma estrela, brilhava em direção das alturas das micro-ondas. Chamei a atenção do demais que comigo se encontravam no THF, inclusive os tenentes Vieira e Paulo sobre a tal luz e constatamos que a mesma aumentou de intensidade, moveu-se com certa velocidade (…).

Trechos do relato do tenente Paulo, Chefe da Seção de Segurança:

“Junto com os demais oficiais, pude ver o objeto luminoso aparecendo no infinito e se aproximando com velocidade anormal para uma aeronave dentro do espaço aéreo do sistema, e apresentava-se como uma estrela de luz clara e forte que se irradiava para todas as direções com movimentos determinado por uma reta e logo após uma quebra de direção e mudança de cor em sua luz para tonalidades as mais diversas. Contatos foram feitos com a torre de controle para verificação de vôos na área, mas apenas uma aeronave havia descido no aeroporto à hora do acontecido.”

Trechos do relato do tenente Vieira, Comandante do DPV-DT61:

“Para minha total surpresa, ao sair da estação de THF, notei, como os demais presentes, uma luz ao longe e que se aproximava rapidamente. De principio a luz se apresentava como um ponto luminoso que se aproximava com velocidade espantosa. A medida que se aproximava tornava-se cada vez mais difusa, com aparência de uma estrela. Sua coloração, em principio, era normal e variando em seguida para tonalidade vermelha e amarela. Ficamos em silêncio para melhor observação e não conseguimos ouvir barulho nenhum com o deslocamento. O objeto se deslocou em nossa direção até uma certa distância, parecendo permanecer parado por alguns minutos. Logo em seguida tomou a direção do radar LP23, sumindo de relance e ao mesmo tempo aparecendo em cima da estação de micro-ondas, para logo em seguida sumir completamente.”

O relatório do Tenente Vieira, Comandante da unidade e testemunha ocular do OVNI, termina definindo quatro pontos em seu relatório ao Comandante do NuCINDACTA (figura 3):

“Após analisar friamente todo o fenômeno, ficou claro os seguinte itens:
– Não se tratava de nenhuma aeronave
– Não havia condições de identificar o objeto
– Não havia animosidade por parte do mesmo
– Não existia a menor possibilidade de ilusão ótica.”

O FUTURO MINISTRO

Três dias após, em 23 de junho de 1978, o Chefe do Núcleo do NuCINDACTA, Coronel Sócrates da Costa Monteiro, encaminhou relatório sobre as ocorrências no Sitio do Gama ao Chefe do Estado-Maior da Aeronáutica – EMAER. O então coronel Sócrates, atualmente na reserva, viria a ser Ministro da Aeronáutica durante o governo Collor de Melo, entre 1990 e 1992. No ano de 2010 concedeu entrevista à Revista UFO sobre o fenômeno que considera genuíno, dando também seu testemunho sobre o caso do Sitio do Gama, dizendo que ao ser informado por telefone sobre os tiros disparados pelos militares contra o OVNI, determinou a interrupção do tiroteio imediatamente; em suas palavras:

“Eles tem uma tecnologia muito mais avançada do que a nossa e não sabemos como reagiriam à nossa ação.”

Informou também que a doutrina da época era não agredir para não sofrer as consequências. Aqui temos algo interessante. Dois antigos ministros da aeronáutica reconhecem a existência do fenômeno, Ministro Joelmir Campos de Araripe Macedo, falecido, e Ministro Sócrates da Costa Monteiro. Por dever de ofício, deviam, devem conhecer muito bem a questão. As investigações devem ter prosseguido, pois, em 17 de outubro de 1978, o chefe do serviço de informações A2 do VI COMAR, emitiu relatório de ocorrência sobre o Sitio do Gama e apresentou o resultado de investigação ao afirmar que, segundo a análise dos depoimentos, confirma integralmente as constatações do relatório do comandante do DPV-DT61. Último detalhe: o objeto não foi detectado pelo radar LP-23, apesar de situação favorável.

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